Logo na introdução do livro Design Gráfico: Uma história Concisa, o designer Richard Hollis¹ afirma que o design gráfico está inserido na cultura e na economia dos países industrializados, para entendermos melhor o que isso significa, precisamos colocar uma luz sobre o conceito de cultura. O sociólogo Antony Giddens² define cultura como elementos das sociedades humanas que são aprendidos e não herdados, que tornam possível a cooperação e a comunicação, podendo ser eles intangíveis, como crenças e valores, e tangíveis, como objetos e tecnologias.

Dando substância à afirmação de Hollis, o design está imerso em uma cultura, ou seja, está preso a um determinado contexto temporal e espacial, fazendo parte da comunicação humana e sendo articulado pelas suas tecnologias, e inserido na economia, de caráter claramente positivista, comunica para públicos alvos determinados em subculturas. Apenas esse panorama já nos dá a complexidade que a abordagem histórica sobre um elemento do design deve ter. Um olhar que considere apenas características formais, desconsiderando o contexto social, a cultura e a tecnologia, pode levar a erros de interpretação e a anacronismos. O historiador Arnold Toynbee³ alerta para essa simplificação, como uma tendência humana de “fazer de conta que o oceano não é tão grande quanto parece; tentamos aplicar a essa ideia os truques do fracionamento e da omissão”.

Toda a produção cultural humana tem antecedentes históricos, mas ela é constantemente atualizada às novas realidades, estando em transformação dinâmica. O Flat design é um desses casos, se fizermos uma análise apenas formal poderemos chegar a conclusão de que ele é a escola modernista suíça reaplicada, e sem muito esforço podemos chegar aos egípcios, ou até antes! Seria correto ignorar os contextos em que cada um desses movimentos está inserido? E suas tecnologias?

A escola modernista suíça, apesar das suas variáveis, absorveu o tom da Bauhauss, o desenvolveu e começou a aplicá-lo ao mundo, em um mundo pós-guerra que começava a se reconstruir, abusando dos manifestos e dos diálogos conceituais. O Flat design apresenta um contexto histórico completamente diverso, de um mundo relativamente pronto, em um período pós-modernista e hiper-objetivo, que não dá lugar à reflexão, apenas à reação. O designer Rick Poynor reconhece as semelhanças entre as escolas modernistas e pós-modernistas e pontua uma diferença fundamental entre elas:

Se o modernismo buscava criar um mundo melhor, o pós-modernismo – para horror de muitos observadores – parece aceitar o mundo como ele é. Ao passo que o modernismo atacava frequentemente a cultura de massa, argumentando, a partir de sua perspectiva de superioridade, saber o que era melhor para o povo, o pós-modernismo se envolve em uma relação de cumplicidade com a cultura dominante. (POYNOR, 2010)4

Esse é o ponto, enquanto a escola suíça tentava imprimir no mundo uma concepção filosófica, o Flat design se apropria de linguagens anteriores para ratificar as dinâmicas sociais contemporâneas. O fato é que ainda é muito cedo para definir o que o Flat Design é e quais são suas reais características formais, é necessária uma distância temporal para fazê-lo. Mas podemos tirar algumas conclusões, a primeira é que ele bebe na fonte de estilos que buscavam a simplificação, a segunda é que ele está fortemente enraizado nas dinâmicas contemporâneas da nossa sociedade e, finalmente, que ele é um fenômeno novo na história do design pelo fato de seu contexto, temporal e espacial, ser diferente de seus predecessores.

Mas tenhamos cuidado, a História não fala sobre fatos, mas sobre interpretações de fatos, e a visão holística consegue chegar mais próxima da verdade, ainda que de maneira não definitiva, por hora conseguimos apenas tatear o Flat Design. Apresentei aqui apenas uma interpretação, a minha, e o diálogo é fundamental para entendermos melhor os fenômenos do Design!

 


  1. HOLLIS, Richard. Design Gráfico: Uma história concisa. 2ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2010. Página 4.
  2. GIDDENS, Anthony. Sociologia. 6ª ed. Lisboa: Fundação Calouse Gulbekian, 2008. Página 23.
  3. TOYNBEE, Arnold. Um Estudo da História. 2ª ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1987. Página 47.
  4. POYNOR, Rick. Abaixo as Regras: Design Gráfico e Pós Modernismo. 1ª Ed. Porto Alegre: Bookman Companhia Editora, 2010. Página 11.