Estar acompanhado daquele bom copo de café (seja com açúcar, adoçante ou apenas o café) não é um hábito restrito aos designers de plantão, mas sim um hábito presente em diversas culturas e que não se limita a uma atividade profissional ou classe social. O fato é: as pessoas bebem café. Mas não somente café… Muitos utilizam outras bebidas que contém a substância chamada cafeína, como o chá ou alguns tipos de energético, para manter a atenção e disposição no esporte, trabalho e estudo.

A cafeína tem diversos benefícios e podemos citar alguns interessantes como diminuição da fadiga, aumento das performances física, cognitiva e motora; auxilio na memória de curto prazo, solução de problemas, tomada de decisão e concentração. São benefícios atrativos obtidos sem muito esforço, apenas com um cafezinho.

Uma matéria a respeito do café e criatividade publicada pelo The New Yorker citou o curioso caso de Honoré de Balzac, notável escritor francês, que chegava a consumir o equivalente a cinquenta copos de café em um dia nas ocasiões em que trabalhava muito. Mas ele não bebia o café, na verdade fazia algo muito mais “emocionante”… Balzac moía os grãos de café até torná-los num pó bem fino e então ingeria o pó de café com o estômago vazio. O próprio Balzac descrevia esse ato como “horrível e brutal”, para ser experimentado por homens de “excessivo vigor”.

Balzac admirava tanto o café que documentou os efeitos do processo em seu ensaio de 1839, chamado “Traité des Excitants Modernes” (Tratado dos Estimulantes Modernos). Em determinada parte do Tratado está escrito “Faíscas disparam por todo o caminho até o cérebro” enquanto “as ideias marcham em movimentos rápidos, como batalhões de um grande exército em seu terreno de combate lendário, e a batalha se trava“. De fato, Balzac possuía uma criatividade muito elevada, mas talvez ele seja um caso específico.

TUDO TEM UM PREÇO

A ingestão de cafeína pode bloquear parte de uma substância chamanda adenosina, que inibe a liberação de várias outras substâncias químicas para dentro do cérebro. Com isso, a adenosina reduz os níveis de energia e promove o sono, dentre outras funções corporais reguladoras. Ao tomar de 2 a 3 xícaras de café você bloqueia 50% dos receptores de adenosina (imagine os 50 cafezinhos do Balzac num só dia!) e quando ocorre esse bloqueio você fica menos propenso a cochilar e perder o foco.

Em resumo, funciona assim: você ingere o café, então a cafeína age em seu organizmo bloqueando a adenosina e liberando a dopamina, inibindo o sono e o deixando em estado de alerta. 

A CRIATIVIDADE

Embora a cafeína possa ser analisada em todos os aspectos, a criatividade é algo difícil de ser estudado em laboratório. Porém, conhecemos a criatividade como a habilidade de ligar ideias, significados e conceitos de forma original, mas para não limitar a definição de um termo tão interessante recomendamos a definição abaixo, de Faiga Ostrower:

“Criar é, basicamente, formar. É poder dar uma forma a algo novo. Em qualquer que seja o campo de atividade, trata-se, nesse ‘novo’, de novas coerências que se estabelecem para a mente humana, fenómenos relacionados de modo novo e compreendidos em termos novos. O ato criador abrange, portanto, a capacidade de compreender; e esta, por sua vez, a de relacionar, ordenar, configurar, significar.” (OSTROWER, 1977, p. 9).

CAFEÍNA versus PENSAMENTO CRIATIVO

O grande ponto em questão é que a criatividade depende de algo muito importante que a cafeína busca evitar: uma mente distraída e sem foco.

Os insights criativos e as diversas soluções provenientes da nossa imaginação ocorrem principalmente quando deixamos de focar em algo, ou seja, quando paramos de pensar num problema específico e dexiando nossa mente vagar livremente em ideias não relacionadas àquele problema.

A quebra na concentração pode aumentar o processamento associativo inconsciente, permitindo-nos perceber conexões que de outra forma não perceberíamos. Além disso, deixar a mente vagar pode facilitar a conexão entre áreas do cérebro que funcionam quando estamos descansando e quando estamos ativos. A cafeína previne nosso foco de ficar tão difuso, mantendo nossa mente num estado hiper-vigilante.

O sono é um processo mental necessário para a criatividade e a cafeína, ao inibir esse processo, torna-se prejudicial à produção de ideias e soluções originais. E não é apenas isso, diversas pesquisas têm comprovado que a privação do sono resulta em efeitos negativos associados à criatividade e clareza de pensamento, que são: diminuição da inteligência emocional, pensamento construtivo e habilidade de lidar com o stress.

O EFEITO PLACEBO

É possível ter os efeitos positivos da cafeína sem a diminuição da criatividade. Algumas pesquisas concluíram que o aumento do foco e estado de alerta também podem ser replicados por meio do efeito placebo. Uma pesquisa feita na University of East London, na qual um grupo de psicólogos examinou os efeitos da cafeína nas habilidades de solução de problemas e respostas emocionais, concluiu que somente a expectativa de ter consumido cafeína pode aumentar sua performance e melhorar o humor.

Na pesquisa, foram dados copos com café cafeinado e descafeinado para um grupo de pessoas que habitualmente tomavam café. O interessante é que o grupo que havia tomado café descafeinado acreditando ser cafeinado, obteve resultados superiores nas tarefas que mensuraram tempo de reação, auto-controle, motivação pela recompensa e humor. O grupo que ingeriu cafeína, mas que na realidade acreditava ter tomado café descafeinado, não demonstrou melhora nos resultados. No entando, num teste específico com recompensa, o grupo que na realidade ingeriu cafeína se mostrou melhor.

CONCLUSÃO

Honoré de Balzac, autor de “A Comédia Humana”, obra com oitenta e oito narrativas e mais de 3000 personagens, poder ter ido muito além da cafeína. No caso de Balzac, é provável que por ele acreditar que a cafeína traria bons resultados em sua produção de ideias, a criatividade foi estimulada por ele próprio. Ou talvez suas ideias já tivessem sido criadas em momentos de óscio criativo e a cafeína o ajudou a organizar e escrever as ideias.

Seja como for, valorize os momentos em que sua mente divaga e utilize a cafeína com moderação, pois ela também perde o efeito caso você tome altas doses habitualmente.

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